Clube da Dona Menô
Dona Menô

Honda Civic
 
Ela estava feliz realmente. Mesmo sabendo que tinha deixado de trabalhar pra receber seu amor que vinha de outro estado - e isso pesaria no orçamento-, ainda assim estava feliz.
 
Pobre e endividada, não percebia que preparava um banquete e abria suas portas com todos os salamaleques para quem tinha uma renda fixa, uma boa aposentadoria e status social, enquanto ela batalhava arduamente e sem sucesso.
 
Ele olhava alheio para seus dramas e ainda dizia que tinha gastos quando vinha ao Rio... Ela, que via naquele homem o símbolo da pureza e honestidade, cortava chuchu e cenourinhas para a dieta dele... Ele dizia que almoçar fora todos os dias era caro, apesar de que não queria saber o que ela gastou no mercado para fazer o almoço em casa...
 
Durante o preparo de um molho à bolonhesa diet, o telefone tocou. O filho dele avisava que tinham roubado seu carro.
 
Ela ouve da sala seu amante dizer: “Sem problemas! Temos seguro!”.
 
Coisa trivial, mas logo, o filho ligou novamente para dizer que gostaria da oportunidade de um zero de outro modelo, um Honda Civic... O pai não titubeou: “Ok! Veja a diferença e eu deposito em sua conta!”.
 
A esta hora ela amassava os tomates com o garfo, mas ao receberem a terceira ligação, ela empunhou armas: “Que será que o filhinho quer agora?...”.
 
Ele respondeu: “São os acessórios... Esqueci que existem os acessórios do carro! O menino quer um bom som, uma boa roda... Ele tem visão, este meu filho...”.
 
Os tomates começaram a ser espetados, mas aquele almofadinha não se dava conta das atitudes ridículas diante de uma mulher que o amava e não vivia o luxo dele. Um luxo sedimentado pela pão-durice e aparência, num metié onde só se olha para seu próprio rabo e espera-se que o outro ao lado não perceba...
 
Daí o sexagenário, achando que estava abafando, investiu: “Vamos passear após o almoço? Paguei o táxi ontem. Você ta pagando hoje?...”.
 
Ela já tinha terminado de fazer o almoço e se meteu no chuveiro. Fechou os olhos e deixou a água fria correr pelo seu corpo. Lembrou de sua mãe, dona de casa, mas uma pessoa extremamente esperta. Parecia que ouvia a voz dela ao seu lado, quando um dia ela disse, tal como num provérbio:
 
“Minha filha, certos homens imploram por um chifre. Pode crer...”.

Leila Marinho Lage
29 de novembro de 2010
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