Síndrome do cérebro inflamado
Eu descobri um neurologista legalzão. Foi que meio por acaso, eu sei...
Josualdo, meu namorado, estava com uns problemas sexuais "lá", e eu tive que marcar uma consulta com o médico que era, a meu ver, mais condizente com a situação. Eu achava que a coisa tava na cabeça de cima. Josualdo não conseguia “chegar junto”, se é que me entendem...
Escolhi um neurologista – Dr Jorge (ou Sérgio, sei lá). Pelo menos eu o acho com cara de Jorge.
Quando estávamos na consulta, Dr Sérgio perguntou:
- “Então, pelo que vejo, o senhor sofre de ejaculação precoce”.
Eu falei, indignadamente:
- “O senhor não vê nada! Aliás, nada se vê! E ele apenas TEM ejaculação precoce. Quem sofre sou eu!”.
O médico é todo esotérico, meio budista, coisas assim... Ele se concentra, fala macio, tem uma conversa hipnotizante. Acho que todo médico de cabeça é muito “cabeça”, e eu não consigo entender seu ritmo “cabeça” de ser. Decidimos que ele seria nosso médico para todas as horas.
Precisavam ver o papo:
- “Esperem um pouquinho que eu tenho que drenar um hematoma num crânio e volto logo para conversar com vocês”.
Esperamos uma hora e voltou Dr Sérgio todo satisfeito, feliz da vida, como se tivesse acabado de comer um misto quente:
- “Bem, o que acontece com vocês, no momento?”.
Bem, no momento eu só sentia vontade de vomitar, já que o neuro estava vindo de um centro cirúrgico e esteve com um cérebro na mão minutos antes...
Aquele médico era diferentaço mesmo. Sentou à nossa frente como se nosso caso fosse o caso mais importante do mundo.
Eu falei:
- “Doutor, agora o Josualdo começou a ter esquecimento. Ontem pela manhã ele colocou a cueca na geladeira . Pior o senhor não sabe. Imagine o que ele fez com o potinho de yogurte”.
Dr Sérgio-Jorge começou:
- “Bem...”.
Por que todo médico começa com a palavra "bem", quando quer falar um monte de outras?Será que ele ri por dentro? Acho que Dr Sérgio não. Ele pensa, pensa e fala “Bem...” - mas sempre pensando no que vai fazer a seguir.
Comentando sobre a parte clínica do Jô, ele disse que seu colesterol estava muito alto e que, associando à sua idade, era uma bomba pronta pra explodir.
Sabiam que fizeram testes com ratinhos comendo apenas gordura, com níveis de colesterol altos e que esses bichinhos apresentavam inflamação no cérebro, ocasionando modificação de comportamento? Sabiam que o colesterol alto pode levar ao aumento da incidência de doença de Alzheimer? Pois, é. Dr Jorge colocou um monte de vídeo lá no seu computador pra gente ver sobre ratos e misto quente. Eu comecei a odiar batatas fritas...
Ele falou:
- “Sr Josualdo, já que tem uma mulher tão bonita e saudável do seu lado (isso foi o melhor da coisa), sugiro que faça uns exames, mude sua alimentação, pratique exercícios, melhore sua condição física e espiritual!".
Eu argumentei:
- “Esta porra vai ser muito difícil”.
Lá veio o mestre:
- “Difícil, mas, não impossível! Pelo menos, que se possa mudar. Qualquer melhora contribuirá para seu estado geral. E se concentre ao máximo em tudo que faz no seu dia-a dia, para que sua cabeça sempre esteja trabalhando”.
O médico parecia um menino prodígio, que poderia ser meu filho. Claro que a consulta não ficou só nisso, mas o que eu quero dizer é que o Dr Sérgio (ou Jorge?) foi direto ao ponto: Josualdo lembrava bem de tudo de seu passado, em detalhes, mas a sua memória recente estava prejudicada. Isso acontece porque os neurônios que captaram seu passado eram jovens e bem oxigenados na época, e os neurônios que aprendem as coisas recentes, são capengas. Meu namorado teria que, além de cuidar da saúde de seu corpo, trabalhar mais o seu cérebro todos os dias para manter sua massa encefálica em atividade.
Ele deu uma idéia: "Palavras cruzadas!". Eu falei que isso me faria ficar mais horas lendo jornal, enquanto esperava na cama...
O doutor sugeriu um monte de coisa em substituição, mas o que mais nos agradou foi "escrever". Hoje em dia nós dois escrevemos todos os dias, sobre tudo. A gente se corresponde com um monte de gente também, inclusive gente pior que Josualdo. Fazemos parte de um grupo de pessoas, mais novas e mais velhas que nós, que acharam em certa hora da vida que a vida deveria ser vivida naquela hora. E a hora é agora. Passeamos, estudamos, escrevemos, fazemos teatro, usamos computador, trabalhamos e ajudamos pessoas mais carentes.
Hoje eu li num papelzinho jogado no chão uma coisa que o Jô escreveu:
“Eu preciso amar minha mulher. Ela está insatisfeita. Mesmo que eu não consiga, vou deitar perto dela, beijar ela, acariciar os cabelos brancos dela e segurar no peito mole dela. Eu a amo e nada é maior do que este sentimento”.
Bem, "gentem", já viram no que vai dar mais tarde, à noite, na cama... Não tem cérebro inflamado, não tem impotência que faça frente ao carinho que tenho por este homem. Vai ser uma noite de arromba, mesmo que nós só fiquemos nas preliminares...
Beijos da Menô
Em algum dia do passado
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