INTERNET PARA CEGOS Eu me controlei para não pegar em sua mão e a conduzir até a porta de saída de minha sala de atendimento - ela ia se confundir. Preferi dar o meu braço para que ela me acompanhasse. Imaginei que, se eu estivesse de olhos fechados e fosse puxada por alguém, me sentiria caminhando para um abismo. Em questão de segundos, quando nos separamos, talvez prematuramente, vi que ela ia a direção a uma parede. Tentei ser rápida com as palavras, porém, falei baixo para não assustar: “Vire para a direita!”. Não precisou: ela desviou naturalmente antes de eu completar minha frase. Fiquei encafifada com aquilo. Como ela poderia saber que tinha que mudar seu rumo? E entendi duas coisas naquele momento: - Ela tinha feito o trajeto ao contrário na sua chegada e, como que por um instinto de sobrevivência, ela memorizou espaço e distância. Sua acompanhante não tinha os mesmos cuidados que eu tentava ter, provavelmente por saber exatamente quando seriam necessários. - Pensei, também, que ela tinha alguma noção de repercussão de sons nos objetos sólidos; talvez, até, um sentido aguçado e instintivo da temperatura ambiente. Toda vez que eu me deparo com um deficiente físico, procuro me comportar como se eu estivesse em seu lugar. Tento fazer as coisas como eu gostaria que alguém agisse comigo, se estivesse na pele dele. Ao realizar um exame físico em um deficiente visual, procuro dizer previamente o que eu vou fazer; faço comentários, cuido para não deixar segundos de silêncios eternos entre as frases. Deve ser muito ruim tentar em vão identificar o que acontece ao redor, principalmente em um ambiente estranho. Dos 5 sentidos (tato, visão, audição, paladar, olfato), o que mais tolhe, a meu ver, é a perda da visão. Muitas vezes o cidadão se sente excluído da sociedade, mesmo sendo integrante desta, com os mesmos direitos. Não é sentimento de pena que vai fazer alguém chegar a lugar nenhum. É o respeito e a compreensão de suas limitações. Já ouvi de alguém que “temos que lutar pela inclusão social do deficiente físico”...Ora, bolas! Desde quando ele é um excluído? Ele faz parte da sociedade, apesar de não ter acesso a todas as facilidades de conforto, lazer, aprendizado e subsistência. Ele não se exclui; ele é excluído, isso, sim. Uma prisão dentro de si mesmo. Era assim que eu via as pessoas com necessidades especiais, até começar a ter maior contato com pacientes com toda espécie de dificuldades - cegueira, surdez, deficiência motora, até mesmo algumas doenças mentais etc. Posso concluir hoje que cada um deles tem um mundo vasto e rico, onde superaram suas restrições e desenvolvem habilidades incomuns aos seres humanos ditos normais. O que acontece é que não possuem oportunidade para exercerem o que adquiriram forçosamente, e isto se deve à falta de conhecimento de todos, ao descaso dos nossos governos e ao preconceito público. Somos perfeitos, mas somos vulneráveis. A visão, tanto humana quanto dos animais, é um complexo projeto de engenharia e física, mas pode ser destruído facilmente por fatores externos e endógenos, e isso pode acontecer em segundos até. Se qualquer um pode estar exposto a isso, deveria ser considerado por nós uma prioridade. Comentei com esta moça que eu lamentava que ela não pudesse participar de meu site. Ela não sabia que eu tinha um e me surpreendeu dizendo: “Mas, por quê?! Eu até fiz curso de Word! Posso ver seu site via teclado e ouvir seus textos através de um software que possuo. Basta que sua página me dê fácil acesso!”. Bem, eu já tinha ouvido falar (com a audição que Deus me deu) sobre programas para cegos, mas pensei que isso não era comum. Comum, comum, não é, pois a Internet e os formatadores de páginas não se preocupam com estas pessoas, além de não serem nada baratos. Vamos dizer assim: Enquanto nós, “os normais”, abrimos uma página de pesquisa ou um site, em segundos somos os maiores conhecedores da cultura, mas um deficiente visual pode levar horas ou dias. Por muitas vezes não conseguem saber o que está diante dos olhos de uma pessoa com visão (ali, pra qualquer um olhar) por pura falta de interesse com os cegos. Decidi reformular meu site já há algum tempo. Estou pensando em mudar muita coisa nele. Chegou a hora de pensar também nestas pessoas. Já fiz alguns áudios com poesias ou textos, e sempre penso que os que não veem seriam beneficiados, mas sempre achei que a possibilidade de um cego chegar ao meu site seria remota, esporádica, casual. Mas, não. Cegos são sedentos de conhecimento e adoram novidades, mais que os outros. O mundo virtual lhes dá o que a relação social lhes priva. Perguntei à minha paciente que tipo de texto ela gostaria que eu gravasse em sua homenagem - se uma crônica, um artigo ou uma poesia. Ela disse que obviamente gostaria de uma poesia, pois era romântica. Aí, vi que sem querer eu estava no caminho certo. Mesmo com meu sotaque arrastado de carioca, posso dar a entonação e interpretação que um programa de computador não pode. Como gasto grana toda vez que gravo em estúdio, a maioria dos trabalhos em áudio é de gravação caseira. Mas, tudo bem, é um começo, né? Agora tenho que ver como eu faço para não embaralhar o cérebro de um cego com tantos links na minha página..Talvez tenha que usar este programa ao lado de uma pessoa que o use. Passo links abaixo, que procurei por aí, a fim de que entendam mais sobre o assunto. Num deles poderão assistir a uma entrevista. Achei muito interessante os Blogs do MAQ. Leila Marinho Lage Sites para pesquisa: Minha crônica (“Enxergue”), no espaço Meus Devaneios: Meus áudios: Versulivre - Texto meu Leitura para maiores de quarenta anos - Texto de Bernard Gontier |