Acessem a galeria de fotos no link abaixo deste texto Morcela ou chouriço?Estive em Portugal no dia 15 de junho. Viagem rápida, que em meia hora eu cheguei. Uma amiga de infância me acordou às 10 horas da madruga convidando-me para um almoço num clube português, no bairro da Tijuca, aqui no Rio de Janeiro. Esta amiga é portuguesa e, apesar de estar aqui desde o tempo de adolescente, quando nos conhecemos no ginásio, ela não perdeu o sotaque e manteve as tradições de sua terra. Nós continuamos amigas ao longo de nossa vida, a ponto de eu fazer os seus dois partos (Priscila e Daniel). Seu nome é Alice Domingues. Ela se formou em advocacia, mas atualmente é apresentadora de um programa (Encontro com Portugal) na Rádio Carioca. Ela sempre me convidava a participar de eventos sociais luso-brasileiros, mas eu nunca ia. Para falar a verdade, eu nunca ia aos aniversários dos filhos e só tinha contato com ela quando se tratava de sua saúde. Eu não entendo como Alice sempre me amou de paixão se eu sou tão diferente dela: desbocada, bagunceira, geniosa e... esquecida. Sou madrinha de Daniel. Uma madrinha que jamais fez o seu papel. Resolvi, então, me redimir. Eu quis ter contato com este mundo artístico, que cultua a música e a dança regionais de Portugal, para fazer um artigo para meu site e os divulgar, principalmente para prestigiar meu afilhado. Conheci e reencontrei pessoas da melhor qualidade, simpáticas, inteligentes, que me receberam muito bem. Eu me senti em casa. Foi uma tarde de muitas risadas, com excelente comida, num ambiente muito agradável: a Casa da Vila da Feira e Terras de Santa Maria. Chamei minha amiga Áurea para me acompanhar. Ela nem sabia para onde ia, mas aceitou de cara, pois topa qualquer parada. Ela costuma dizer: “Se é pra se divertir, vamos nos divertir direito!”. E, assim, acreditando tratar-se de um bom programa, lá fomos nos encontrar com esta família. Foi mais do que um bom programa. Eu estive em contato com minhas raízes, com o meu segundo povo, além de poder estar com os bebês que eu coloquei no mundo e hoje são adultos. Logo ao chegarmos, a Orquestra Barrados no Baile começou a tocar, bem ao estilo Glenn Miller, passando por Michael Legrand, dentre outros. Bem, não sei se foi por causa disso, mas em certa hora, algumas mulheres de nosso grupo (não digo quem) começaram a mostrar as suas tatuagens. Minha amiga Alice, sempre muito educada e serena, passava de mesa em mesa para saudar todos, enquanto eu corria de um lado ao outro do salão para fotografar tudo o que podia. Áurea só sabia rir (não sei se para mim ou de mim...). Após a apresentação do Barrados no Baile eu pensei que o show tinha acabado, mas, não. Alguém gritou: “Vai entrar o rancho!”. Todos deram passagem para o grupo folclórico Almeida Garrett, que chegou tocando castanholas, rodopiando, pulando, num sincronismo e energia perfeitos. Como não entendo de nada, eu digo apenas que dançavam o "vira". Lindo, lindo, lindo! Nossa! Que emoção! Era como se eu estivesse em Portugal. Eu senti perfeitamente a presença de minha mãe naquele salão. De repente Áurea ficou concentrada e disse: “Se minha mãe viesse aqui hoje, ia se apaixonar”. Aí, eu me lembrei que Áurea tem ascendência caboverdiana. Nós duas concomitantemente, talvez por motivos diferentes, nos sentimos emocionadas. Depois chegou a hora da projeção em tempo real da partida de futebol entre Portugal e Suíça pela Eurocopa. Eu acho que Portugal perdeu de dois a zero, mas eu não estava nem aí. Aliás, depois do vinho eu nem sabia onde eu estava. Eu só me dei conta de tempo e espaço quando apareceu lá no palco alguém com uma garrafa de licor e um chouriço. Eu chamei Alice e perguntei a ela se aquilo era morcela, apontando em direção àquela coisa entortilhada, em forma de linguiça. E só deu tempo de eu ouvir: “Fechado por 50 reais para a senhora de verde azeitona! Parabéns!”. Eu acabara de adquirir num leilão sem querer um dos melhores néctares dos deuses e um chouriço - que pensei ser morcela - por uma bagatela. Quando a festa terminou ainda continuamos no clube. Sr Fernando Sanfoneiro, que toca concertina (e que não parava de tocar, nem conversando conosco), junto com o maestro Antonio Seixas, juntou-se a nós. Virou uma grande família luso-brasileira - dois povos unidos pela alegria e simplicidade de um domingo muito bonito. Ninguém queria ir embora. Todos nós nos abraçávamos e nos beijávamos fraternalmente, como se fôssemos velhos conhecidos. É assim que deveria ser todos os dias - aqui no Brasil e em Portugal. Quando eu cheguei a minha casa, a primeira coisa que fiz foi comer a “morcela”. Tinha gosto de salaminho; não era o que eu pensava ser... Leila Marinho Lage Casa da Vila da Feira |