Clube da Dona Menô
Dona Menô

Medos

Não sou um exemplo em sabedoria sobre filosofia ou mesmo espiritualidade. Acho que tenho estas coisas todas, mas de um modo rudimentar, que os entendidos chamam de “não trabalhadas”.

Eu acho que não preciso trabalhar nada. A vida me ensinará o que vai ficar realmente registrado como importante. O que é de valor vai aparecer e acontecer. Não precisarei “burilar” nenhuma percepção que, a princípio é instintiva, pura, sem qualquer influência intelectual.

Do que falo? Dos medos... Não exatamente os meus, mas os medos os quais me deparo com certa freqüência em minha profissão. O medo ao que me refiro nesta crônica-artigo é o do câncer.

Nós vivemos em cidades neuróticas, onde a gente não sabe se vai ser assaltada ao sair de casa para ir ao mercadinho. A gente não sabe se uma bala perdida vai encontrar nosso cérebro ou se algum maluco vai nos agarrar num beco; se um assaltante de carro, cheio de cocaína na cuca, vai projetar uma bala em nossa barriga, mesmo depois de fazer o seu ganho.

A gente tem medo... Uns têm medos estranhos, como o de entrar em elevadores. São fobias. Uma das maiores fobias é estar em lugares altos. Outra fobia, muito em voga, é a síndrome do pânico, que na verdade não é fobia, e sim, uma disfunção neurológica.

Pessoas têm medos incrustados em suas trajetórias de vida. Uns são explicáveis, outros não. Como entender uma pessoa que passou a vida inteira com medo de tudo, até de sair sozinha para a rua, para ir a um banco, para descer uma escada rolante, e que de repente tem coragem de encarar uma doença grave e se sair bem dessa?

Uma pessoa que teve um câncer e ficou calma como uma nuvem; que fez seu tratamento todinho, mesmo o mais difícil, e em nenhum momento se desesperou, perdeu a vontade de se curar ou se revoltou. Como entender que uma pessoa “medrosa” em questão de dias tenha se tornado a pessoa muito corajosa e tenha surpreendido todos à sua volta?

Assim foi com uma paciente, que hoje está curada de um câncer grave. Ao perguntar para ela o que a fez ter tanta força, sua resposta foi:

“Desde que me conheço por gente tenho medo de algo que eu não sabia o que era. Eu sabia apenas que eu tinha medos infundados, mas, mesmo assim, eu sofria. Quando o bicho papão me apareceu ao vivo e em cores, bem diante de meu nariz, vi que não precisava mais fugir, pois já havia encontrado aquilo que me atrapalhou a ser tranquila durante minha vida toda. Daí, lutei contra ele e aqui estou. Eu só precisava saber o nome dele...”.

Medos todos nós temos, mas dar nomes aos bois, vai depender do que achamos ser nossos bichos-papões.

Leila Marinho Lage
Rio, 30 de julho de 2009